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O DOENTE E A SAÚDE


No próximo fim de semana, em São Paulo, participarei como palestrante do 1º Encontro Nacional dos Agentes da Pastoral da Saúde (CNBB). Na minha palestra enfocarei os aspectos teológicos, morais e sociais da doutrina da Igreja sobre a saúde e a doença.
Na economia da salvação, a doença e o sofrimento estiveram sempre entre os problemas mais graves que afligem a vida humana. Na doença, o homem experimenta a sua incapacidade, os seus limites, a sua finitude. Qualquer enfermidade pode fazer-nos entrever a morte. Mas a doença pode levar à angústia, ao fechar-se em si mesmo e até, por vezes, ao desespero e à revolta contra Deus. Mas também pode tornar uma pessoa mais amadurecida, ajudá-la a discernir, na sua vida, o que não é essencial para se voltar para o que o é. Muitas vezes, a doença leva à busca de Deus, a um regresso a Ele.
Comovido por tanto sofrimento, Cristo não só Se deixa tocar pelos doentes, como também faz suas as misérias deles: «Tomou sobre Si as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças» (Mt 8, 17). Pela sua paixão e morte na cruz. Cristo deu novo sentido ao sofrimento, que pode configurar-nos com Ele e unir-nos à sua paixão redentora.
“Os doentes são a figura de Jesus Cristo. Muitos comprovadamente delinquentes, blasfemos, chegam inesperadamente ao hospital por disposição última da misericórdia de Deus, que os quer salvos. Nos hospitais, a missão das irmãs, dos médicos, dos enfermeiros, consiste em colaborar com esta infinita misericórdia, ajudando, perdoando, sacrificando-se... Bem-aventurados nós, médicos, tantas vezes incapazes de remover uma enfermidade, felizes de nós, se levarmos em conta que, além de corpos, estamos em face de almas imortais, para as quais urge o preceito evangélico de amá-las como a nós mesmos” (São José Moscatti, médico).
 “Doentes precisam de médico”, disse Jesus (Lucas 5,31). Não estão de acordo com o Evangelho, os que, pensando confiar em Deus, dispensam o recurso aos médicos. Ele mesmo não curou todos os doentes. Por isso, nem as orações mais fervorosas obtêm sempre a cura de todas as doenças. A vida e a saúde física são bens preciosos, confiados por Deus. Temos a obrigação de cuidar razoavelmente desses dons, tendo em conta as necessidades alheias e o bem comum. O cuidado da saúde dos cidadãos requer a ajuda da sociedade para se conseguirem condições de vida que permitam crescer e atingir a maturidade: alimentação, vestuário, casa, cuidados de saúde, ensino básico, emprego e assistência social.
No enfoque ético, “a moral natural e cristã mantém em toda a parte os seus direitos imprescritíveis; é deles, e não de considerações de sentimentalismo, de filantropia materialista, naturalista, que derivam os princípios essenciais da deontologia médica; a dignidade do corpo humano, a superioridade da alma sobre o corpo, a fraternidade de todos os homens, o domínio soberano de Deus sobre a vida e sobre o destino” (Pio XII; radiomensagem ao VII Congresso Internacional de Médicos Católicos, sobre a moral e o direito dos médicos, 11/8/1956).

 *Bispo da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney

O DOENTE MERECE ATENÇÃO

          “No próximo dia 11 de fevereiro, celebrar-se-á em toda a Igreja a XXVI Jornada Mundial do Doente, sob o tema: “Mater Ecclesiae: ‘Eis o teu filho! (…) Eis a tua mãe!’ E, desde aquela hora, o discípulo acolheu-a como sua” (Jo 19, 26-27), tomado das palavras que Jesus, do alto da cruz, dirige a Maria, sua mãe, e a João.
          Em sua mensagem, o Papa Francisco nos ensina: “O serviço da Igreja aos doentes e a quantos cuidam deles deve continuar, com vigor sempre renovado, por fidelidade ao mandato do Senhor (cf. Lc 9, 2-6, Mt 10, 1-8; Mc 6, 7-13) e seguindo o exemplo muito eloquente do seu Fundador e Mestre”.
          Estas palavras do Senhor (o tema dessa jornada) iluminam profundamente o mistério da Cruz. Esta não representa uma tragédia sem esperança, mas o lugar onde Jesus mostra a sua glória e deixa amorosamente as suas últimas vontades, que se tornam regras constitutivas da comunidade cristã e da vida de cada discípulo”.
        Em primeiro lugar, as palavras de Jesus dão origem à vocação materna de Maria em relação a toda a humanidade. Será, de uma forma particular, a mãe dos discípulos do seu Filho e cuidará deles e do seu caminho. E, como sabemos, o cuidado materno dum filho ou duma filha engloba tanto os aspectos materiais como os espirituais da sua educação”.
        “O sofrimento indescritível da cruz trespassa a alma de Maria (cf. Lc 2, 35), mas não a paralisa. Pelo contrário, lá começa para Ela um novo caminho de doação, como Mãe do Senhor. Na cruz, Jesus preocupa-Se com a Igreja e toda a humanidade, e Maria é chamada a partilhar esta mesma preocupação. Os Atos dos Apóstolos, ao descrever a grande efusão do Espírito Santo no Pentecostes, mostram-nos que Maria começou a desempenhar a sua tarefa na primeira comunidade da Igreja. Uma tarefa que não mais terá fim”.
        “O discípulo João, o amado, representa a Igreja, povo messiânico. Ele deve reconhecer Maria como sua própria mãe... Toda a comunidade dos discípulos fica envolvida na vocação materna de Maria. João, como discípulo que partilhou tudo com Jesus, sabe que o Mestre quer conduzir todos os homens ao encontro do Pai. Pode testemunhar que Jesus encontrou muitas pessoas doentes no espírito, porque cheias de orgulho (cf. Jo 8, 31-39), e doentes no corpo (cf. Jo 5, 6). A todos, concedeu misericórdia e perdão e, aos doentes, também a cura física, sinal da vida abundante do Reino, onde se enxugam todas as lágrimas. Como Maria, os discípulos são chamados a cuidar uns dos outros; mas não só: eles sabem que o Coração de Jesus está aberto a todos, sem exclusão. A todos deve ser anunciado o Evangelho do Reino, e a caridade dos cristãos deve estender-se a todos quantos passam necessidade, simplesmente porque são pessoas, filhos de Deus”.
        “Esta vocação materna da Igreja para com as pessoas necessitadas e os doentes concretizou-se, ao longo da sua história bimilenária, numa série riquíssima de iniciativas a favor dos enfermos. Esta história de dedicação não deve ser esquecida...”.



 

A PAZ NO ORIENTE

         Celebramos nesta semana a Epifania (manifestação) do Senhor. Foi o dia em que Jesus se manifestou como Salvador de todos os povos, na pessoa dos Reis do Oriente, que vieram visitar o Menino Jesus em Belém, exemplo de perseverança na vocação, ao chamado de Deus, nas dificuldades e tentações da vida. “Aquela estrela era a graça”, diz Santo Agostinho.
          Deus usa de vários meios para chamar a si as pessoas, meios adaptados à personalidade e às condições de cada um. Aos pastores, judeus, já familiarizados com as revelações divinas do Antigo Testamento, Deus chamou através dos anjos, mensageiros da boa nova do nascimento de Jesus. Os Magos, porém, eram pagãos. Como eram astrônomos e astrólogos, Deus os chamou através de uma estrela misteriosa. Jesus não discrimina ninguém: no seu presépio vemos pobres e ricos, judeus e árabes. Todos são bem-vindos ao berço do pacífico Menino Deus.
          Jesus veio ao mundo trazer a paz, a sua paz, a verdadeira: “Dou-vos a minha paz. Não é à maneira do mundo que eu a dou” (Jo 14, 27).  “Príncipe da Paz” é o título que lhe dava o profeta Isaías: “seu nome será... Príncipe da Paz” (Is 9,5). Esse foi o cântico dos anjos na noite de Natal: “Glória a Deus no mais alto dos céus, e, na terra, paz aos que são do seu agrado!” (Lc 2, 14). Essa foi a sua saudação ao ressuscitar: “A paz esteja convosco” (Jo 20, 19 ss).
           Já em sua mensagem de Natal “Urbi et Orbi” do Natal de 2016, o Papa Francisco falava da paz no mundo e pedia a oração pela paz.
           “Ele, só Ele, nos pode salvar. Só a Misericórdia de Deus pode libertar a humanidade de tantas formas de mal – por vezes monstruosas – que o egoísmo gera nela. A graça de Deus pode converter os corações e suscitar vias de saída em situações humanamente irresolúveis. Onde nasce Deus, nasce a esperança: Ele traz a esperança. Onde nasce Deus, nasce a paz. E, onde nasce a paz, já não há lugar para o ódio e a guerra. E, no entanto, precisamente lá onde veio ao mundo o Filho de Deus feito carne, continuam tensões e violências, e a paz continua um dom que deve ser invocado e construído. Oxalá israelitas e palestinos retomem um diálogo direto e cheguem a um acordo que permita a ambos os povos conviverem em harmonia, superando um conflito que há muito os mantém contrapostos, com graves repercussões na região inteira”.
            E na mensagem para o dia mundial da Paz deste ano, o mesmo Papa Francisco insiste: “Inspiram-nos as palavras de São João Paulo II: ‘Se o sonho de um mundo em paz é partilhado por tantas pessoas..., a humanidade pode tornar-se sempre mais família de todos e a nossa terra uma real casa comum’. Ao longo da história, muitos acreditaram neste ‘sonho’ e as suas realizações testemunham que não se trata duma utopia irrealizável”.
             A paz é possível, mas depende das pessoas implicadas no processo. Se houver ganância, orgulho, incompreensão, atropelo das leis, o não reconhecimento dos direitos dos outros, ela se torna impossível, devido ao mau uso do livre arbítrio que Deus nos deu. E enquanto não reconhecerem aquele que veio trazer a paz, Jesus, nem judeus nem palestinos terão a paz. 

A SEMANA MAIOR

        Nesta semana mais importante do ano, celebramos o mistério pascal, recordando a Paixão, Morte e, na Páscoa, a Ressurreição de Jesus Cristo, sua vitória sobre o pecado e a morte. Neste tempo, “manteremos o olhar fixo sobre Jesus Cristo: nele encontra plena realização toda a ânsia e anelo do coração humano. A alegria do amor, a resposta ao drama da tribulação e do sofrimento, a força do perdão diante da ofensa recebida e a vitória da vida sobre o vazio da morte... Nele, morto e ressuscitado para a nossa salvação, encontram plena luz os exemplos de fé que marcaram esses dois mil anos da nossa história da salvação” (Porta Fidei).
 “A missão, que trouxe Jesus entre nós, atinge o seu cumprimento no mistério pascal. Do alto da cruz, donde atrai todos a Si (Jo 12, 32), antes de ‘entregar o Espírito’, Jesus diz: ‘Tudo está consumado’ (Jo 19, 30). No mistério da sua obediência até à morte, e morte de cruz (Fl 2, 8), cumpriu-se a nova e eterna aliança. Na sua carne crucificada, a liberdade de Deus e a liberdade do homem juntaram-se definitivamente num pacto indissolúvel, válido para sempre. Também o pecado do homem ficou expiado, uma vez por todas, pelo Filho de Deus (Hb 7, 27; 1 Jo 2, 2; 4, 10)... No mistério pascal, realizou-se verdadeiramente a nossa libertação do mal e da morte” (Bento XVI, Sacramentum Charitatis, 9).
“Do paradoxo da Cruz surge a resposta às nossas interrogações mais inquietantes. Cristo sofre por nós: Ele assume sobre si os sofrimentos de todos e redime-os. Cristo sofre conosco, dando-nos a possibilidade de partilhar com Ele os nossos sofrimentos. Juntamente com o de Cristo, o sofrimento humano torna-se meio de salvação... ‘Agora alegro-me nos sofrimentos que suporto por vós e completo na minha carne o que falta às tribulações de Cristo, pelo seu Corpo, que é a Igreja’ (Cl 1, 24). O sofrimento, aceito com fé, torna-se a porta para entrar no mistério do sofrimento redentor do Senhor. Um sofrimento que já não priva da paz e da felicidade, porque é iluminada pelo esplendor da ressurreição” (S. João Paulo II).
“Este é o coração pulsante do querigma apostólico, no qual ocupa um lugar central e fundamental a misericórdia divina. Nele sobressai ‘a beleza do amor salvífico de Deus manifestado em Jesus Cristo morto e ressuscitado’ (Evangelii gaudium, 36). Então a Misericórdia ‘exprime o comportamento de Deus para com o pecador, oferecendo-lhe uma nova possibilidade de se arrepender, converter e acreditar’ (Misericordiӕ Vultus, 21)
Assim, a Quaresma, cujo término é a Semana Santa, “é um novo começo, uma estrada que leva a um destino seguro: a Páscoa de Ressurreição, a vitória de Cristo sobre a morte. E este tempo não cessa de nos dirigir um forte convite à conversão: o cristão é chamado a voltar para Deus «de todo o coração» (Jl 2, 12), não se contentando com uma vida medíocre, mas crescendo na amizade do Senhor. Jesus é o amigo fiel que nunca nos abandona, pois, mesmo quando pecamos, espera pacientemente pelo nosso regresso a Ele e, com esta espera, manifesta a sua vontade de perdão” (Francisco, Quaresma de 2017). Feliz Páscoa a todos! 

FELIZ ANO NOVO DE PAZ!

            Em sua mensagem para o 50º dia mundial da Paz, que se celebra no próximo dia 1º de janeiro, sob o título “A não-violência: estilo de uma política para a paz”, o Santo Padre, o Papa Francisco, formula seus votos de paz aos povos e nações do mundo inteiro, aos chefes de Estado e de governo, aos responsáveis das Comunidades Religiosas e das várias expressões da sociedade civil, rezando para que “a imagem e semelhança de Deus em cada pessoa nos permitam reconhecer-nos mutuamente como dons sagrados com uma dignidade imensa”, insistindo que “sobretudo nas situações de conflito, respeitemos esta dignidade mais profunda e façamos da não violência ativa o nosso estilo de vida”.
Desejo deter-me na não-violência como estilo duma política de paz, e peço a Deus que nos ajude, a todos nós, a inspirar na não-violência as profundezas dos nossos sentimentos e valores pessoais. Sejam a caridade e a não-violência a guiar o modo como nos tratamos uns aos outros nas relações interpessoais, sociais e internacionais. Quando sabem resistir à tentação da vingança, as vítimas da violência podem ser os protagonistas mais credíveis de processos não-violentos de construção da paz. Desde o nível local e diário até ao nível da ordem mundial, possa a não-violência tornar-se o estilo caraterístico das nossas decisões, dos nossos relacionamentos, das nossas ações, da política em todas as suas formas”.
A guerra e a vingança não são a solução: “A violência não é o remédio para o nosso mundo dilacerado. Responder à violência com a violência leva, na melhor das hipóteses, a migrações forçadas e a atrozes sofrimentos, porque grandes quantidades de recursos são destinadas a fins militares e subtraídas às exigências do dia-a-dia dos jovens, das famílias em dificuldade, dos idosos, dos doentes, da grande maioria dos habitantes da terra. No pior dos casos, pode levar à morte física e espiritual de muitos, se não mesmo de todos”.
“O próprio Jesus viveu em tempos de violência. Ensinou que o verdadeiro campo de batalha, onde se defrontam a violência e a paz, é o coração humano: ‘Porque é do interior do coração dos homens que saem os maus pensamentos’ (Mc 7, 21). Mas, perante esta realidade, a resposta que oferece a mensagem de Cristo é radicalmente positiva: Ele pregou incansavelmente o amor incondicional de Deus, que acolhe e perdoa, e ensinou os seus discípulos a amar os inimigos (cf. Mt 5, 44) e a oferecer a outra face (cf. Mt 5, 39). Quando impediu, aqueles que acusavam a adúltera, de a lapidar (cf. Jo 8, 1-11) e na noite antes de morrer, quando disse a Pedro para repor a espada na bainha (cf. Mt 26, 52), Jesus traçou o caminho da não-violência que Ele percorreu até ao fim, até à cruz, tendo assim estabelecido a paz e destruído a hostilidade (cf. Ef 2, 14-16). Por isso, quem acolhe a Boa Nova de Jesus, sabe reconhecer a violência que carrega dentro de si e deixa-se curar pela misericórdia de Deus, tornando-se assim, por sua vez, instrumento de reconciliação, como exortava São Francisco de Assis: A paz que anunciais com os lábios, conservai-a ainda mais abundante nos vossos corações”.

MISSÕES E MISERICÓRIDIA

          No próximo domingo, a Igreja celebra o dia mundial das Missões. Em sua mensagem para esse dia das Missões, com o tema “Igreja missionária, testemunha de misericórdia”, o Papa Francisco ensina que “o Jubileu Extraordinário da Misericórdia, que a Igreja está vivendo, proporciona uma luz particular também ao Dia Mundial das Missões de 2016: convida-nos a olhar a missão ad gentes como uma grande, imensa obra de misericórdia quer espiritual quer material. Com efeito, neste Dia Mundial das Missões, todos somos convidados a ‘sair’, como discípulos missionários, pondo cada um a render os seus talentos, a sua criatividade, a sua sabedoria e experiência para levar a mensagem da ternura e compaixão de Deus à família humana inteira. Em virtude do mandato missionário, a Igreja tem a peito quantos não conhecem o Evangelho, pois deseja que todos sejam salvos e cheguem a experimentar o amor do Senhor. Ela ‘tem a missão de anunciar a misericórdia de Deus, coração pulsante do Evangelho’ (Bula Misericordiae Vultus, 12), e anunciá-la em todos os cantos da terra, até alcançar toda a mulher, homem, idoso, jovem e criança”.
            É claro que essa atividade missionária requer empenho e sacrifício, para secundarmos assim a ação de Deus, já que ele quis usar de nós: “Em muitos lugares, a evangelização parte da atividade educativa, à qual o trabalho missionário dedica esforço e tempo, como o vinhateiro misericordioso do Evangelho (cf. Lc 13, 7-9; Jo 15, 1), com paciência para esperar os frutos depois de anos de lenta formação; geram-se assim pessoas capazes de evangelizar e fazer chegar o Evangelho onde ninguém esperaria vê-lo realizado. A Igreja pode ser definida ‘mãe’, mesmo para aqueles que poderão um dia chegar à fé em Cristo. Espero, pois, que o povo santo de Deus exerça o serviço materno da misericórdia, que tanto ajuda os povos que ainda não conhecem o Senhor a encontrá-Lo e a amá-Lo. Com efeito, a fé é dom de Deus, e não fruto de proselitismo; mas cresce graças à fé e à caridade dos evangelizadores, que são testemunhas de Cristo. Quando os discípulos de Jesus percorrem as estradas do mundo, é-lhes pedido aquele amor sem medida que tende a aplicar a todos a mesma medida do Senhor...”.
        A missão que Jesus confiou à sua Igreja é universal, para todos os povos: “Cada povo e cultura tem direito de receber a mensagem de salvação, que é dom de Deus para todos... Os missionários sabem, por experiência, que o Evangelho do perdão e da misericórdia pode levar alegria e reconciliação, justiça e paz. O mandato do Evangelho – ‘Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo quanto vos tenho mandado’ (Mt 28, 19-20) – não terminou, antes pelo contrário impele-nos a todos, nos cenários presentes e desafios atuais, a sentir-nos chamados para uma renovada ‘saída’ missionária: cada cristão e cada comunidade há de discernir qual é o caminho que o Senhor lhe pede, mas todos somos convidados a aceitar esta chamada: sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho”.


NÃO AO SABOR DO VENTO

          “Que fostes ver no deserto? Uma cana agitada pelo vento?... Em verdade, eu vos digo, entre todos os nascidos de mulher não surgiu quem fosse maior que João Batista” (Mt 11, 7.11).
Já comemoramos o nascimento de São João Batista no dia 24 de junho. E no último dia 29, celebramos o seu martírio, sua degolação.
Qual foi a causa da sua morte? São João Batista pregava o arrependimento do pecado e a mudança de vida: “Convertei-vos...” (Mt 3,1). Era o homem da verdade, sem acepção de pessoas. O Rei Herodes havia tomado para si a mulher do seu irmão, Herodíades. João o admoestava contra o seu pecado de infidelidade conjugal e incesto, o que atraiu a ira da amante do rei, que o instigou a meter João no cárcere. “Pois João vivia dizendo a Herodes: ‘Não te é permitido viver com ela’” (Mt 14, 4). No dia do aniversário de Herodes, a filha de Herodíades, Salomé, dançou na frente dos convivas, o que levou o rei, meio embriagado, a prometer-lhe como prêmio qualquer coisa que pedisse. A filha perguntou à mãe, que não perdeu a oportunidade de vingar-se daquele que invectivava seu pecado. Fez a filha pedir ao rei a cabeça de João Batista. João foi decapitado na prisão, merecendo o elogio de Jesus, por ser um homem firme e não uma cana agitada ao sabor do vento.
Estamos no Ano da Misericórdia, proclamado pelo Papa Francisco.  É tempo de perdão. Muita gente pode interpretar mal esse tempo, achando que pode continuar no pecado e receber o perdão. Mas a absolvição supõe o arrependimento e o propósito de deixar o pecado, sem o que o perdão não acontece. O discernimento pastoral prático de uma situação particular, no qual devemos usar toda a misericórdia e compreensão, não anula a regra geral dada por Nosso Senhor: “Quem despede sua mulher e se casa com outra, comete adultério... E se a mulher despede seu marido e se casa com outro, comete adultério também” (Mc 10, 11-12).
“Deus em Jesus é um Deus que tem um sumo respeito pela liberdade da pessoa. ‘Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa’ (Ap 2, 20ª). Não arromba a porta, para entrar de qualquer maneira. A ‘abertura da porta’, de que fala a Escritura, é a conversão ou arrependimento. Conversão, arrependimento e misericórdia que perdoa são como o côncavo e o convexo da mesma figura: uma não se dá sem a outra (Cardeal Carlo Carafa, Arcebispo de Bolonha).
O Cardeal Jorge Medina, prefeito emérito da Congregação para o Culto Divino, no seu livreto “Arrependimento, Porta da Misericórdia”, com apresentação do Cardeal Carafa, acima citado, explica: “O Concílio de Trento define o arrependimento como ‘dor da alma e reprovação do pecado cometido, acompanhados pelo propósito de não pecar mais no futuro’. Este ato de contrição foi sempre necessário para pedir a remissão dos pecados...” E ele continua: “Vivemos em uma sociedade na qual pouco a pouco se está perdendo a sensibilidade em relação ao pecado...”. Esclarece, enfim, que “arrepender-se significa recorrer a Deus, Pai de misericórdia”. 

JOVENS NA POLÔNIA

          Estamos em Cracóvia, Polônia, onde se realiza, de 26 a 31 deste mês de julho, a XXIX Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que tem como tema “Bem-aventurados os misericordiosos, pois obterão misericórdia (Mt 5,7)”. A cidade de Cracóvia, terra de São João Paulo II, é também a cidade de Santa Faustina Kowalska, que recebeu a mensagem de Jesus Misericordioso. A cidade e o tema dessa jornada mundial foram justamente escolhidos por estarmos no Ano da Misericórdia, para que os nossos jovens se impregnem dessa grande verdade divina, modelo para nós: a Misericórdia.
           A Jornada Mundial da Juventude é um grande encontro de jovens de todo o mundo à volta do Santo Padre, o Papa. É uma jornada de evangelização da Igreja, que, através dessas Jornadas, continua a anunciar a mensagem de Jesus Cristo aos jovens de hoje. A JMJ caracteriza-se como uma peregrinação: jovens do mundo inteiro estarão acorrendo ao “Santuário Mundial da Juventude” para o encontro com Cristo.  Essa é a parte espiritual e moral da JMJ, a mais importante de todas. Ademais, a JMJ, até no aspecto humano é um evento único e altamente promissor, pois busca promover reflexões que visam à construção de uma sociedade mais justa e fraterna.
         Como explicou o Arcebispo de Cracóvia, Dom Stanislaw Dziwisz, que fora secretário particular de São João Paulo II: “João Paulo II é o ‘Santo dos jovens’, é o idealizador, o fundador da Jornada Mundial da Juventude e o Papa Francisco é muito amado pelos jovens: estas duas figuras extraordinárias se reencontrarão nesta Jornada de Cracóvia... João Paulo II viu que os jovens procuram, questionam: é necessário dar-lhes uma resposta, é necessário guia-los. Os jovens têm necessidade deum bom pastor, de bons pastores. E aqui se realiza isto”.
Neste tempo de ‘mudança de época’, em que nossa juventude assume o seu profetismo cristão nas manifestações pacíficas e com objetivos claros de cidadania, todos nós, como peregrinos, somos chamados a ser ‘protagonistas de um mundo novo’. Por isso mesmo, o peregrino discípulo-missionário pauta sua vida pela disponibilidade e fraternidade. Não procura levar vantagem em nada por se colocar a serviço e tampouco desanima com as dificuldades próprias de uma grande concentração. Ele, com isso, ganha a pertença ao Reino, a certeza do amor de Deus e de ser para os outros sinal cândido de misericórdia e de amor. O peregrino leva no seu coração e reparte com os outros a esperança de tempos novos. Nos tempos de hoje, com as violências, guerras, corrupções, maldades, divisões, dependências e frustrações, o peregrino é sinal de que em Cristo Ressuscitado, a esperança tem seu fundamento” (Dom Orani).
           Possa esta Jornada Mundial da Juventude trazer muitos bons frutos para a nossa juventude, tão carente de Deus, e que esses jovens possam ser portadores da grande e bela mensagem cristã a todos os ambientes em que vivem: família, amigos, escola, divertimentos, sendo verdadeiramente o sal da terra e a luz do mundo. 

JOVENS NA POLÔNIA

          Estamos em Cracóvia, Polônia, onde se realiza, de 26 a 31 deste mês de julho, a XXIX Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que tem como tema “Bem-aventurados os misericordiosos, pois obterão misericórdia (Mt 5,7)”. A cidade de Cracóvia, terra de São João Paulo II, é também a cidade de Santa Faustina Kowalska, que recebeu a mensagem de Jesus Misericordioso. A cidade e o tema dessa jornada mundial foram justamente escolhidos por estarmos no Ano da Misericórdia, para que os nossos jovens se impregnem dessa grande verdade divina, modelo para nós: a Misericórdia.
            A Jornada Mundial da Juventude é um grande encontro de jovens de todo o mundo à volta do Santo Padre, o Papa. É uma jornada de evangelização da Igreja, que, através dessas Jornadas, continua a anunciar a mensagem de Jesus Cristo aos jovens de hoje. A JMJ caracteriza-se como uma peregrinação: jovens do mundo inteiro estarão acorrendo ao “Santuário Mundial da Juventude” para o encontro com Cristo.  Essa é a parte espiritual e moral da JMJ, a mais importante de todas. Ademais, a JMJ, até no aspecto humano é um evento único e altamente promissor, pois busca promover reflexões que visam à construção de uma sociedade mais justa e fraterna.
            Como explicou o Arcebispo de Cracóvia, Dom Stanislaw Dziwisz, que fora secretário particular de São João Paulo II: “João Paulo II é o ‘Santo dos jovens’, é o idealizador, o fundador da Jornada Mundial da Juventude e o Papa Francisco é muito amado pelos jovens: estas duas figuras extraordinárias se reencontrarão nesta Jornada de Cracóvia... João Paulo II viu que os jovens procuram, questionam: é necessário dar-lhes uma resposta, é necessário guia-los. Os jovens têm necessidade deum bom pastor, de bons pastores. E aqui se realiza isto”.
 “Neste tempo de ‘mudança de época’, em que nossa juventude assume o seu profetismo cristão nas manifestações pacíficas e com objetivos claros de cidadania, todos nós, como peregrinos, somos chamados a ser ‘protagonistas de um mundo novo’. Por isso mesmo, o peregrino discípulo-missionário pauta sua vida pela disponibilidade e fraternidade. Não procura levar vantagem em nada por se colocar a serviço e tampouco desanima com as dificuldades próprias de uma grande concentração. Ele, com isso, ganha a pertença ao Reino, a certeza do amor de Deus e de ser para os outros sinal cândido de misericórdia e de amor. O peregrino leva no seu coração e reparte com os outros a esperança de tempos novos. Nos tempos de hoje, com as violências, guerras, corrupções, maldades, divisões, dependências e frustrações, o peregrino é sinal de que em Cristo Ressuscitado, a esperança tem seu fundamento” (Dom Orani).
             Possa esta Jornada Mundial da Juventude trazer muitos bons frutos para a nossa juventude, tão carente de Deus, e que esses jovens possam ser portadores da grande e bela mensagem cristã a todos os ambientes em que vivem: família, amigos, escola, divertimentos, sendo verdadeiramente o sal da terra e a luz do mundo. 

O TRIBUNAL

        Conforme foi noticiado, no dia 28 de maio último, a Diocese de Campos criou o Tribunal Eclesiástico Diocesano, ao qual fica agregada a Câmara Eclesiástica da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney, especialmente para o julgamento de processos de declaração de nulidade matrimonial. Essa instituição concretiza o mandamento do Papa Francisco, na sua Carta Apostólica Mitis Iudex Dominus Iesus (O Senhor Jesus, Juiz Manso), sobre a reforma do processo canônico dessas causas: “O Bispo constitua para a sua diocese o tribunal diocesano para as causas de nulidade do matrimônio, salva a faculdade para o mesmo Bispo de se valer de outro tribunal mais próximo diocesano ou interdiocesano” (Cân. 1673, § 2).
      Lembramos que o Matrimônio, ratificado e consumado, por instituição divina e eclesiástica, é indissolúvel: “O que Deus uniu o homem não separe” (Mt 19,6).  Assim, ninguém, nem o Papa, pode anular um casamento entre batizados, que tenha sido válido, ratificado e legitimamente consumado.
   Mas há muitas causas que podem ter invalidado um casamento, aparentemente válido. Impedimentos não dispensados, ausência de total liberdade, erro de pessoa, etc., podem viciar o consentimento matrimonial, tornando-o inválido. Assim, a Igreja não anula esses casamentos, mas apenas declara que foram nulos desde o começo. É nisso que consiste o processo de declaração de nulidade matrimonial no Tribunal Eclesiástico.
       A regra que dirige a Igreja é aquela já cantada no Salmo 85, 11: “A Misericórdia e a Verdade se encontram, a Justiça e a Paz se abraçam”, ou seja, o equilíbrio entre a misericórdia e a justiça, entre a compreensão com a fraqueza humana e a verdade da lei divina da unidade e da indissolubilidade do matrimônio, especialmente nos casamentos fracassados.
        O progresso nos estudos canônicos tem propiciado um maior aprofundamento das causas que podem ter tornado nulos muitos casamentos aparentemente válidos, agora mais desenvolvidas e detalhadas com essa carta apostólica do Papa Francisco.
       Do lado da misericórdia, temos a insistência do nosso Papa sobre a compreensão e o acolhimento dessas pessoas que sofreram com o fracasso do seu matrimônio. Do lado da justiça, não se pode esquecer os princípios imutáveis do sagrado matrimônio. Por isso, o Tribunal obrigatoriamente tem em seu corpo jurídico o “Defensor do Vínculo”.
      A Igreja tem grandes santos que morreram por defender a indissolubilidade do Matrimônio, a começar por São João Batista, que foi decapitado por dizer ao rei Herodes que não lhe era lícito possuir a mulher de outro.
       São Tomás More e São João Fischer foram martirizados por não concordarem com o divórcio do rei Henrique VIII, que, para tentar anular seu primeiro casamento, proclamou-se chefe da Igreja na Inglaterra, criando o cisma anglicano. A Igreja preferiu perder todo um país a não transgredir a lei divina da indissolubilidade matrimonial.

O BOM LADRÃO

     

Neste ano da Misericórdia, recordamos uma das personagens mais emblemáticas do perdão que Jesus veio nos trazer: o Bom Ladrão, São Dimas, aquele que estava no Calvário, na cruz ao lado de Jesus, que lhe pediu uma lembrança e recebeu dele a promessa do Paraíso.
Na Cruz onde pagava seus crimes, o Bom Ladrão praticou todas as virtudes: a Fé, reconhecendo em Jesus o Rei Messias, a humildade, confessando os próprios pecados que lhe fizeram merecer a morte de cruz, a caridade e o apostolado para com o outro ladrão, dando-lhe bons conselhos, a paciência, a oração, pedindo a Jesus que se lembrasse dele, etc.
Recordamos trechos do belíssimo sermão do Pe. Antônio Vieira, pregado na Igreja da Misericórdia de Lisboa, no ano de 1655. Antigo, mas muito atual, nesses tempos de corrupção.
Falando de Jesus, que levou o Bom Ladrão ao Paraíso, ele exclama: “Levarem os reis consigo ao Paraíso ladrões, não só não é companhia indecente, mas ação tão gloriosa e verdadeiramente real, que com ela coroou e provou o mesmo Cristo a verdade do seu reinado, tanto que admitiu na cruz o título de rei. Mas o que vemos praticar em todos os reinos do mundo, é tanto pelo contrário, que em vez de os reis levarem consigo os ladrões ao Paraíso, os ladrões são os que levam consigo os reis ao inferno...”.
E lembra o princípio de Santo Tomás e Santo Agostinho: “Se o alheio que se tomou ou retém se pode restituir e não se restitui, a penitência deste e dos outros pecados não é verdadeira penitência, senão simulada e fingida, porque se não perdoa o pecado sem se restituir o roubado, quando quem roubou tem possibilidade de o restituir. Esta única exceção da regra foi a felicidade do bom ladrão, e esta a razão porque ele se salvou, e também o mau se pudera salvar sem restituírem... Porém se o bom ladrão tivera bens com que restituir, ou em todo, ou em parte o que roubou, toda a sua fé e toda a sua penitência tão celebrada dos Santos, não bastara a o salvar, se não restituísse... Vejam agora, de caminho, os que roubaram na vida e nem na vida, nem na morte restituíram, antes na morte testaram de muitos bens, e deixaram grossas heranças a seus sucessores; vejam onde irão, ou terão ido suas almas, se se podiam salvar”.
“A lei da restituição é Lei Natural e Lei Divina...”. Os que ocupam cargos de autoridade “estão obrigados à restituição como os ladrões; e pecam tanto mais gravemente que os mesmos ladrões, quanto é mais perigoso e mais comum o dano com que ofendem a justiça pública, de que eles estão postos por defensores”. ‘Tirada a justiça, que são os governos se não grandes roubalheiras? (S. Agostinho)’. “O ladrão que furta para comer não vai nem leva ao inferno: os que não só vão, mas levam são os ladrões de maior calibre e de mais alta esfera... Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos...”.  “Quem não entra pela porta é ladrão (Jo 10,1)... A porta por onde legitimamente se entra ao cargo é só o merecimento... Uns entram pelo parentesco, outros pela amizade, outros pelo suborno, e todos pela negociação... Agora será ladrão oculto, mas depois ladrão descoberto...”.

A SEMANA DO PERDÃO

        Nesta semana mais importante do ano, celebramos o mistério pascal, recordando a Paixão, Morte e, na Páscoa, a Ressurreição de Jesus Cristo, sua vitória sobre o pecado e a morte. Neste tempo, “manteremos o olhar fixo sobre Jesus Cristo: nele encontra plena realização toda a ânsia e anelo do coração humano. A alegria do amor, a resposta ao drama da tribulação e do sofrimento, a força do perdão diante da ofensa recebida e a vitória da vida sobre o vazio da morte... Nele, morto e ressuscitado para a nossa salvação, encontram plena luz os exemplos de fé que marcaram esses dois mil anos da nossa história da salvação” (Porta Fidei).
 “A missão, que trouxe Jesus entre nós, atinge o seu cumprimento no mistério pascal. Do alto da cruz, donde atrai todos a Si (Jo 12, 32), antes de ‘entregar o Espírito’, Jesus diz: ‘Tudo está consumado’ (Jo 19, 30). No mistério da sua obediência até à morte, e morte de cruz (Fil 2, 8), cumpriu-se a nova e eterna aliança. Na sua carne crucificada, a liberdade de Deus e a liberdade do homem juntaram-se definitivamente num pacto indissolúvel, válido para sempre. Também o pecado do homem ficou expiado, uma vez por todas, pelo Filho de Deus (Hb 7, 27; 1 Jo 2, 2; 4, 10)... No mistério pascal, realizou-se verdadeiramente a nossa libertação do mal e da morte” (Bento XVI, Sacramentum Charitatis, 9).
“Do paradoxo da Cruz surge a resposta às nossas interrogações mais inquietantes. Cristo sofre por nós: Ele assume sobre si os sofrimentos de todos e redime-os. Cristo sofre conosco, dando-nos a possibilidade de partilhar com Ele os nossos sofrimentos. Juntamente com o de Cristo, o sofrimento humano torna-se meio de salvação. Eis por que o crente pode dizer com São Paulo: "Agora alegro-me nos sofrimentos que suporto por vós e completo na minha carne o que falta às tribulações de Cristo, pelo seu Corpo, que é a Igreja" (Cl 1, 24). O sofrimento, aceite com fé, torna-se a porta para entrar no mistério do sofrimento redentor do Senhor. Um sofrimento que já não priva da paz e da felicidade, porque é iluminada pelo esplendor da ressurreição” (S. João Paulo II).
        Este é o coração pulsante do querigma apostólico, no qual ocupa um lugar central e fundamental a misericórdia divina. Nele sobressai ‘a beleza do amor salvífico de Deus manifestado em Jesus Cristo morto e ressuscitado’ (Evangelii gaudium, 36), aquele primeiro anúncio que ‘sempre se tem de voltar a ouvir de diferentes maneiras e aquele que sempre se tem de voltar a anunciar, duma forma ou doutra, durante a catequese’ (Ibid., 164). Então a Misericórdia ‘exprime o comportamento de Deus para com o pecador, oferecendo-lhe uma nova possibilidade de se arrepender, converter e acreditar’ (Misericordiӕ Vultus, 21), restabelecendo precisamente assim a relação com Ele. E, em Jesus crucificado, Deus chega ao ponto de querer alcançar o pecador no seu afastamento mais extremo, precisamente lá onde ele se perdeu e afastou d'Ele. E faz isto na esperança de assim poder finalmente comover o coração endurecido da sua Esposa” (Francisco, mensagem para a Quaresma de 2016).

CINZAS DE MISERICÓRDIA

          Amanhã, quarta-feira de Cinzas, começa o importante tempo litúrgico da Quaresma, no qual a Igreja almeja que nos unamos mais intimamente ao Mistério Pascal de Nosso Senhor Jesus Cristo, mistério que inclui sua Paixão, sua morte e sua gloriosa Ressurreição.
Neste Ano Santo da Misericórdia, o Papa Francisco, em sua mensagem para esta Quaresma, toma como modelo Nossa Senhora, “Maria, ícone duma Igreja que evangeliza porque evangelizada. Maria, por ter acolhido a Boa Notícia que Lhe fora dada pelo arcanjo Gabriel, canta profeticamente, no Magnificat, a misericórdia com que Deus A predestinou”.
E o Papa nos pede que “a Quaresma deste Ano Jubilar seja vivida mais intensamente como tempo forte para celebrar e experimentar a misericórdia de Deus (Misericordiӕ Vultus, 17). Com o apelo à escuta da Palavra de Deus e à iniciativa ‘24 horas para o Senhor’, quis sublinhar a primazia da escuta orante da Palavra, especialmente a palavra profética. Com efeito, a misericórdia de Deus é um anúncio ao mundo; mas cada cristão é chamado a fazer pessoalmente experiência de tal anúncio”.
A História da Salvação é a história da Misericórdia de Deus para com o seu povo: “O mistério da misericórdia divina desvenda-se no decurso da história da aliança entre Deus e o seu povo Israel. Na realidade, Deus mostra-Se sempre rico de misericórdia, pronto em qualquer circunstância a derramar sobre o seu povo uma ternura e uma compaixão viscerais, sobretudo nos momentos mais dramáticos quando a infidelidade quebra o vínculo do Pacto e se requer que a aliança seja ratificada de maneira mais estável na justiça e na verdade. Encontramo-nos aqui perante um verdadeiro e próprio drama de amor, no qual Deus desempenha o papel de pai e marido traído, enquanto Israel desempenha o de filho/filha e esposa infiéis. São precisamente as imagens familiares – como no caso de Oseias (cf. Os 1-2) – que melhor exprimem até que ponto Deus quer ligar-Se ao seu povo”.
E tudo se resume e engloba na Encarnação do Verbo: “Este drama de amor alcança o seu ápice no Filho feito homem. N’Ele, Deus derrama a sua misericórdia sem limites até ao ponto de fazer d’Ele a Misericórdia encarnada. Na realidade, Jesus de Nazaré enquanto homem é, para todos os efeitos, filho de Israel. E é-o ao ponto de encarnar aquela escuta perfeita de Deus que se exige a cada judeu pelo Shemà, fulcro ainda hoje da aliança de Deus com Israel: ‘Escuta, Israel! O Senhor é nosso Deus; o Senhor é único! Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças’ (Dt 6, 4-5)”.  
“Portanto a Quaresma deste Ano Jubilar é um tempo favorável para todos poderem, finalmente, sair da própria alienação existencial, graças à escuta da Palavra e às obras de misericórdia. Se, por meio das obras corporais, tocamos a carne de Cristo nos irmãos e irmãs necessitados de ser nutridos, vestidos, alojados, visitados, as obras espirituais tocam mais diretamente o nosso ser de pecadores: aconselhar, ensinar, perdoar, admoestar, rezar...”

FELIZ ANO NOVO DE PAZ!

         Em sua mensagem para o XLIX dia mundial da Paz, que se celebra no próximo dia 1º de janeiro, sob o título “Vence a indiferença e conquista a paz”, o Papa Francisco nos lembra de que “Deus não é indiferente; importa-Lhe a humanidade! Deus não a abandona!” E continua: “Com esta minha profunda convicção, quero, no início do novo ano, formular votos de paz e bênçãos abundantes, sob o signo da esperança, para o futuro de cada homem e mulher, de cada família, povo e nação do mundo, e também dos chefes de Estado e de governo e dos responsáveis das religiões. Com efeito, não perdemos a esperança de que o ano de 2016 nos veja a todos firme e confiadamente empenhados, nos diferentes níveis, a realizar a justiça e a trabalhar pela paz. Na verdade, esta é dom de Deus e trabalho dos homens; a paz é dom de Deus, mas confiado a todos os homens e a todas as mulheres, que são chamados a realizá-lo”.
E o Papa nos exorta à esperança, apesar dos males que nos acometeram nesse ano que termina, que nos fez temer uma terceira guerra mundial: “Embora o ano passado tenha sido caracterizado, do princípio ao fim, por guerras e atos terroristas, com as suas trágicas consequências de sequestros de pessoas, perseguições por motivos étnicos ou religiosos, prevaricações, multiplicando-se cruelmente em muitas regiões do mundo, a ponto de assumir os contornos daquela que se poderia chamar uma ‘terceira guerra mundial por pedaços’, todavia alguns acontecimentos dos últimos anos e também do ano passado incitam-me, com o novo ano em vista, a renovar a exortação a não perder a esperança na capacidade que o homem tem, com a graça de Deus, de superar o mal, não se rendendo à resignação nem à indiferença. Tais acontecimentos representam a capacidade de a humanidade agir solidariamente, perante as situações críticas, superando os interesses individualistas, a apatia e a indiferença”.
A grande esperança está nesse Ano Santo: “Nesta mesma perspectiva, com o Jubileu da Misericórdia, quero convidar a Igreja a rezar e trabalhar para que cada cristão possa maturar um coração humilde e compassivo, capaz de anunciar e testemunhar a misericórdia, de ‘perdoar e dar’, de abrir-se ‘àqueles que vivem nas mais variadas periferias existenciais, que muitas vezes o mundo contemporâneo cria de forma dramática’, sem cair ‘na indiferença que humilha, na habituação que anestesia o espírito e impede de descobrir a novidade, no cinismo que destrói’” (Misericordiae vultus, 14-15).
E o Papa salienta as principais formas de indiferença: “A primeira forma de indiferença na sociedade humana é a indiferença para com Deus, da qual deriva também a indiferença para com o próximo e a criação. Trata-se de um dos graves efeitos dum falso humanismo e do materialismo prático, combinados com um pensamento relativista e niilista. O homem pensa que é o autor de si mesmo, da sua vida e da sociedade; sente-se autossuficiente e visa não só ocupar o lugar de Deus, mas prescindir completamente d’Ele; consequentemente, pensa que não deve nada a ninguém, exceto a si mesmo, e pretende ter apenas direitos...”

ESPERANDO O NATAL

             Interrogam-nos às vezes o que achamos da proliferação de igrejas pelo nosso Brasil afora. De um lado, reconhecemos a busca do povo pela religiosidade, por Deus, pelas coisas espirituais. Por outro lado, lamentamos profundamente que se abuse da boa fé do povo e da sua procura por Deus e se lhes ofereçam caminhos errados. Estamos em “um novo período da história, caracterizado pela desordem generalizada..., pela difusão de uma cultura distante e hostil à tradição cristã e pela emergência de variadas ofertas religiosas que tratam de responder, à sua maneira, muitas vezes errônea, à sede de Deus que nossos povos manifestam”(DocAp 10). 
            É tempo de mais reflexão e oração. E hoje, por sinal, começamos a Novena de preparação para o Santo Natal. Será um Natal especial, dentro do Ano Santo da Misericórdia. “Jesus Cristo é o rosto da misericórdia do Pai. O mistério da fé cristã parece encontrar nestas palavras a sua síntese. Tal misericórdia tornou-se viva, visível e atingiu o seu clímax em Jesus de Nazaré. O Pai, ‘rico em misericórdia’ (Ef 2, 4), depois de ter revelado o seu nome a Moisés como ‘Deus misericordioso e clemente, vagaroso na ira, cheio de bondade e fidelidade’ (Ex34, 6), não cessou de dar a conhecer, de vários modos e em muitos momentos da história, a sua natureza divina. Na ‘plenitude do tempo’ (Gl 4, 4), quando tudo estava pronto segundo o seu plano de salvação, mandou o seu Filho, nascido da Virgem Maria, para nos revelar, de modo definitivo, o seu amor. Quem O vê, vê o Pai (cf. Jo 14, 9). Com a sua palavra, os seus gestos e toda a sua pessoa, Jesus de Nazaré revela a misericórdia de Deus” (Papa Francisco, Misericordiae vultus,1). É esse Jesus misericordioso que esperamos no Natal.
E o esperamos em companhia da Mãe de Misericórdia, Maria Santíssima, modelo de expectativa do Messias. Na oração litúrgica das Vésperas dos dias que antecedem a grande festa natalina, cantam-se as belíssimas antífonas latinas que começam com a exclamação de desejo “Ó!”: Ó Sabedoria, Ó Adonai, Ó Raiz de Jessé, Ó Chave de Davi, Ó Oriente, Ó Rei das Nações, Ó Emanuel, palavras das antigas profecias bíblicas, referentes ao Salvador. Por causa dessas antífonas da expectação, o povo deu a ela o título de Nossa Senhora do Ó.
O Documento de Aparecida exalta “o papel tão nobre e orientador que a religiosidade popular desempenha, especialmente a devoção mariana, que contribuiu para nos tornar mais conscientes de nossa comum condição de filhos de Deus” (37). Mas, reconhece que “no entanto, devemos admitir que essa preciosa tradição começa a diluir-se... Nossas tradições culturais já não se transmitem de uma geração à outra...” (39). “Observamos que o crescimento percentual da Igreja não segue o mesmo ritmo que o crescimento populacional... Verificamos, deste modo, uma mentalidade relativista no ético e no religioso.... Nas últimas décadas vemos com preocupação, que numerosas pessoas perdem o sentido transcendental de suas vidas e abandonam as práticas religiosas... ‘Percebe-se certo enfraquecimento da vida cristã no conjunto da sociedade e da própria pertença à Igreja Católica’ (Bento XVI)” (100).

PELAS NOVAS MINORIAS

          O ministério da misericórdia de Jesus, que recebia e perdoava os pecadores, continuará até o final dos séculos, através da Igreja. Ele perdoou até a mulher flagrada em adultério. Mas lhe disse uma importante palavrinha no final: “Vai, e de agora em diante não peques mais” (Jo 8, 11). Ao paralítico curado Jesus admoestou: “Não peques mais, para que não te aconteça coisa pior” (Jo 5, 14). O perdão é condicionado ao arrependimento e ao propósito de não mais pecar.
            Muito se tem falado das minorias. Mas há aqueles que o Cardeal Timothy Dolan, de Nova Iorque, chamou de “novas minorias”: “A Igreja precisa acolher uma ‘nova minoria’: os fiéis que vivem em santidade... Poderia eu sugerir que há uma nova minoria no mundo, e até mesmo na Igreja? Estou pensando naqueles que, confiando na Graça e Misericórdia de Deus, se esforçam para viver na virtude e na fidelidade, - dado o fato de que, apenas na América do Norte, apenas metade dos casais que se casam procuram a Igreja para contrair o Sacramento do Matrimônio; casais que, inspirados pelo ensinamento da Igreja, afirmam que o casamento é para sempre, e perseveram nas provações; casais que recebem o Dom divino de ter vários filhos; homem e mulher jovens que optam por não viver juntos antes do Matrimônio; um homem 'gay' ou uma lésbica que querem viver em castidade; um casal que decidiu que ela vai desistir de uma carreira promissora para ficar em casa e criar seus filhos. – Essas maravilhosas pessoas muitas vezes se sentem como uma minoria em seu ambiente cultural, sim, – e às vezes até mesmo dentro da Igreja! Eu acho que há muito mais pessoas do que pensamos nestas situações, mas, dada a enorme pressão dos nossos tempos, eles muitas vezes se sentem excluídos. Onde podem buscar apoio e incentivo? Na TV? Nas revistas ou jornais? Em quais filmes? Nos espetáculos como os da Broadway? Nos colegas? Não! Eles olham para a Igreja e para nós, procurando por apoio e incentivo, pela sensação calorosa de serem parte de uma comunidade. E nós [Igreja] não podemos decepcioná-los!”.
Eles merecem toda a nossa atenção, incentivo, oração e apoio. E não seria para eles um desalento, uma tentação até, se os equiparássemos, ou mesmo os preteríssemos àqueles que, por fraqueza e falta desse heroísmo não levaram até o fim o seu casamento, àqueles que aderem à cultura do descartável, àqueles que querem consolar sua consciência com a aprovação da Igreja, mas sem abandonarem o seu estado pecaminoso? Não seria um desestímulo para essa “nova minoria” a concessão de benefícios ilícitos a esses que não querem deixar o pecado? 
O Papa S. João Paulo II, na Familiaris Consortio (n. 84), falando sobre a não admissão dos divorciados recasados à mesa eucarística, além do motivo de seu estado e condições de vida contradizer objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, acrescenta outro peculiar motivo pastoral: “se se admitissem estas pessoas à Eucaristia, os fiéis seriam induzidos em erro e confusão acerca da doutrina da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimônio”. O Papa pensava nas novas minorias, os que querem ser fiéis à Igreja, que poderiam ficar confusos.

A CONVERSÃO DE BARRABÁS

              O título desse artigo poderia ser “A força de um olhar”. Pietro Sarubbi, quando adolescente, fugiu de casa e foi trabalhar num circo. Viajou pelo mundo como ator de teatro e cinema, tentando preencher o vazio espiritual que o afligia. Em 2001, conseguiu um papel coadjuvante em Hollywood, mas seu vazio existencial continuava. Meses depois apareceu uma oferta para colaborar com Mel Gibson. Pensou que o filme seria de ação, mas era sobre a Paixão de Jesus. Nunca imaginou que poderia atuar em uma representação da Paixão de Cristo, porque naquele momento estava muito longe da Igreja. Queria encarnar o apóstolo Pedro. Não por algo espiritual, mas porque pagavam melhor por dia de trabalho. Por isso, não escondeu sua decepção quando o diretor disse que o procurava para interpretar Barrabás (agência Zenit).
            Mel Gibson, o diretor, explicou-lhe que Barrabás era mais que um bandido, um animal sem palavras, o que se expressava em seu olhar.  Era por isso que ele tinha sido escolhido para interpretá-lo, pois, depois de investigar, achou que ele parecia encarnar bem esse animal selvagem e, ao mesmo tempo, refugiar no fundo do seu coração o olhar de um homem bom.
            Um dia, no set de filmagens, Sarubbi ficou absorto contemplando por uns momentos seu colega Jim Caviezel, que interpretava Jesus. Faltavam poucos minutos para gravar a cena onde o povo perdoava Barrabás e condenava o Messias. Surpreendentemente, o ator e Barrabás se transformaram numa só pessoa. A cena avançou e ele já não atuava, vivia, vibrava com os acontecimentos. “Não, a esse não! Barrabás!’ Os gritos da multidão tinham alcançado o seu objetivo. Estava livre! Inflado pela sua boa sorte, olhava ironicamente para as autoridades e, em seguida, para a multidão. E, finalmente, descendo as escadas, seu olhar se encontrou com o de Jesus. “Foi um grande impacto. Senti como se tivesse uma corrente elétrica entre nós. Eu via o próprio Jesus”, diz Pietro Sarubbi. A partir daquele momento, diz ele, tudo em sua vida mudou. Aquela paz que eu tinha procurado por anos, finalmente tinha invadido sua alma.
“Ao olhar nos meus olhos, seus olhos não tinham ódio ou ressentimento, apenas misericórdia e amor”. O ator italiano relata assim a sua fulminante conversão no livro “De Barrabás a Jesus, convertido por um olhar”, onde mostra a razão da sua gratidão com aquele personagem, Barrabás, que ele tinha resistido a encarnar: “Ele é o homem que Jesus salvou da cruz. É ele que representa toda a humanidade”.
Foi esse olhar misericordioso de Jesus que mirou Pedro no pátio da casa de Caifás e que o fizeram chorar amargamente (Lc  22, 61), para se tornar o grande São Pedro. Vem à nossa mente o célebre madrigal renascentista “ojos claros, serenos” de Gutierre de Cetina, adaptado por Francisco Guerrero: “Olhos claros, serenos, que fixaram em vosso apóstolo Pedro aí, olhai para mim e reparai o que eu perdi. Se atado fortemente, quereis sofrer por mim e ser açoitado, não me olheis irado, para que não pareçais menos clemente. Pois choro amargamente, voltai os olhos serenos, e já que morreis por mim, olhai-me ao menos”.