CRIAÇÃO E EVOLUÇÃO

         Alguns ficaram injustamente escandalizados com a afirmação do Santo Padre, o Papa Francisco, em seu discurso de 27/10/2014, sobre a teoria da evolução, pensando até que o Papa estivesse defendendo o evolucionismo ateu. Há que se distinguir entre teoria da evolução, defensável e aceitável, e o evolucionismo, ideologia materialista que ensina a evolução total com a ausência do Criador. (Marx e Engels utilizaram a teoria da evolução de Darwin para propagar o materialismo ateu do comunismo). Também é necessário distinguir o criacionismo, ideologia que defende erroneamente a interpretação literal da Bíblia como parâmetro da ciência, da teoria da Criação, verdade que a Igreja, e nós com ela, defendemos e ensinamos.
            Na verdade, o Papa Francisco afirmou que “a evolução na natureza não contrasta com a noção de criação, porque a evolução pressupõe a criação dos seres que evoluem”. Ele explica que Deus “criou os seres e deixou que se desenvolvessem segundo as leis internas que Ele deu a todos, para que se desenvolvessem, para que chegassem à sua plenitude. Ele deu autonomia aos seres do universo ao mesmo tempo em que assegurou Sua presença contínua, dando o ser a toda a realidade”. Ou seja, Deus criou o mundo e o acompanha com as leis que Ele criou. É o que chamamos a Divina Providência.
            Além disso, o Pontífice explicou que é aceitável a teoria que explica o começo do universo através de uma grande explosão, aventada pelo sacerdote católico belga Georges Lamaître, chamada de Big Bang. Aliás, o Pontífice afirmou que “o começo do mundo não é obra do acaso, mas que deriva diretamente de um Princípio supremo que cria por amor”.
            Já em 1951, o Papa Pio XII havia acolhido com simpatia a teoria do Big Bang, afirmando ser ela perfeitamente compatível com o ensino da Igreja sobre a criação do mundo por Deus, “a obra da onipotência criadora, cuja força, saída do potente ‘fiat’ pronunciado a milhões de anos pelo Espírito criador, se propagou no universo, chamando à existência com um gesto de amor generoso a matéria exuberante de energia. Realmente parece que a ciência moderna, olhando para milhões de séculos atrás, conseguiu se tornar testemunha daquele primordial Fiat lux (Faça-se a luz), pelo qual do nada irrompe, com a matéria, um mar de luz e radiação, enquanto as partículas químicas dos elementos se separam e se reúnem em milhões de galáxias” (Pio XII, discurso de 22/11/1951). 

O evolucionismo, materialista ateu e marxista, acaba transformando a matéria em deus. A matéria seria perfeitíssima, conteria todas as perfeições nas quais se transformaria, eterna, onipotente, criadora por si mesma do céu e da terra: mas essa é a definição de Deus! E quem provocou a tal explosão inicial, onipotente, inteligente e organizadora? Na ânsia de negar o Deus pessoal inteligente, chega-se ao deus matéria cega e bruta. Como seríamos contraditórios, se negássemos a Deus! E mais crentes, pois é preciso ter mais “fé” para ser ateu, crendo no absurdo, do que para crer em Deus Onipotente e eterno, com uma Fé lógica e racional.

A IGREJA E O RACISMO

        Amanhã, dia 20 de novembro, comemora-se o dia nacional da consciência negra, cujo fim é o da superação do racismo, especialmente contra os de pele negra ou similar. 
      Antropologicamente, a palavra “raça”, referindo-se a seres humanos, está superada, pois biologicamente significa “subespécie” e conota um preconceito contra certos grupos humanos, o que vem a ser “racismo”. Às vezes se usa o termo “raça” para identificar um grupo cultural ou étnico-linguístico, mas seriam preferíveis os termos “população”, “etnia” ou “cultura”.
         A Igreja já se pronunciou diversas vezes contra o preconceito baseado na cor da pele ou na etnia, proclamando, firmada na divina Revelação, a dignidade de toda a pessoa criada à imagem de Deus, a unidade do gênero humano no plano do Criador e a reconciliação com Deus de toda a humanidade pela Redenção de Cristo, que destruiu o muro de ódio que separava os mundos contrapostos, para que em Cristo se recapitulassem todos os seres humanos. Com essas premissas, a Igreja prega o respeito recíproco dos grupos étnicos e das chamadas “raças” e a sua convivência fraterna. A mensagem de Cristo foi para todos os povos e nações, sem distinção nem preferências.          É o tema repetido por São Paulo: “Não há distinção entre judeu e grego, porque todos têm um mesmo Senhor...” (Rm 10,12); “já não há judeu nem grego, nem escravo nem livre..., pois todos vós sois um em Cristo Jesus” (Gal 3, 28).
         Infelizmente, com a descoberta e colonização do Novo Mundo, no século XVI, começaram a surgir abusos e ideologias racistas. Os Papas não tardaram a reagir. Assim, em 1537, na Bula Sublimis Deus, o Papa Paulo II denunciava os que consideravam os indígenas como seres inferiores e solenemente afirmava: “No desejo de remediar o mal que foi causado, nós decidimos e declaramos que os chamados Indígenas, bem como todas as populações com que no futuro a cristandade entrará em relação, não deverão ser privados da sua liberdade e dos seus bens – não obstante as alegações contrárias – ainda que eles não sejam cristãos, e que, ao contrário, deverão ser deixados em pleno gozo da sua liberdade e dos seus bens”. Mais tarde, o Papa Urbano VIII teve até de excomungar aqueles que detinham escravos indígenas. É claro que essas normas da Igreja nem sempre foram obedecidas, mesmo por muitos dos seus membros. Quando começou o tráfico de Negros, vendidos pelos próprios africanos como escravos e trazidos para as novas terras, os Papas e os teólogos pronunciaram-se contra essa prática abominável. O Papa Leão XIII condenou-a com vigor na sua encíclica In Plurimis, de maio de 1888, ao felicitar o Brasil por ter abolido a escravidão. E o Papa São João Paulo II não hesitou, no seu discurso aos intelectuais africanos, em Yaoundé, em 13 de agosto de 1985, em deplorar que pessoas pertencentes a nações cristãs tenham contribuído para esse tráfico de Negros. 
       E quando, fruto da ideologia racista do século XVIII, surgiu na Alemanha o partido totalitário nacional-socialista, o Papa Pio XI, na sua encíclica Mit Brennender Sorge, condenou com firmeza as doutrinas nazistas da superioridade da raça ariana sobre as demais.

O MURO DE BERLIM

           Domingo passado, dia 9 de novembro, ao menos um milhão de alemães reuniram-se em Berlim para comemorar os 25 anos da derrubada do muro, erguido pelos comunistas, que, durante 28 anos, dividiu a Alemanha. Muitíssimos fugitivos, tentando escapar do regime comunista para o mundo ocidental, - é claro, pois ninguém quis passar de cá para lá - perderam a vida, na tentativa de atravessar a barreira de 154 km de extensão. Nos números oficiais, 137 alemães morreram tentando atravessá-la e outros 5.000 conseguiram furar o seu bloqueio. Na minha coleção de pedras, guardo como “relíquia” um pedaço do destruído muro de Berlim.
     A queda do “muro da vergonha” simbolizou a falência do comunismo, como regime econômico e ideológico. Estavam presentes nas comemorações o ex-líder soviético Mikhail Gorbachev, o ex-presidente polonês Lech Walesa, considerados personagens-chave do processo que levou ao fim do comunismo europeu. Mas, ausentes em corpo, presentes, porém, na memória do mundo, deveriam ser homenageados outros personagens que contribuíram para isso, como Ronald Reagan, Margareth Thatcher e, especialmente, São João Paulo II.
            S. João Paulo II, em 1991, fazia a pergunta: “Após a falência do comunismo, pode-se dizer que o sistema social vencedor é o capitalismo e que para ele se devem encaminhar os esforços dos países que procuram reconstruir as suas economias e a sua sociedade?” E ele mesmo responde: “Se por ‘capitalismo’ se indica um sistema econômico que reconhece o papel fundamental e positivo da empresa, do mercado, da propriedade privada e da consequente responsabilidade pelos meios de produção, da livre criatividade humana no setor da economia, a resposta é certamente positiva, embora talvez fosse mais apropriado falar de ‘economia de mercado’, ou simplesmente de ‘economia livre’”.
            Mas então a Igreja aprova simplesmente o chamado “capitalismo liberal e selvagem”? O próprio João Paulo II ensina: “Se por ‘capitalismo’ se entende um sistema onde a liberdade no setor da economia não está enquadrada num sólido contexto jurídico que a coloque ao serviço da liberdade humana integral e a considere como uma particular dimensão desta liberdade, cujo centro seja ético e religioso, então a resposta é sem dúvida negativa” (Enc. Cent. Annus, 42).

         Se despreza a Deus e sua lei na economia, o capitalismo se equivale na maldade ao comunismo: “Aqui está precisamente o grande erro das tendências dominantes no último século, erro destrutivo, como demonstram os resultados tanto dos sistemas marxistas como inclusive dos capitalistas. Falsificam o conceito de realidade com a amputação da realidade fundante, e por isso decisiva, que é Deus... O sistema marxista, onde governou, não só deixou uma triste herança de destruições econômicas e ecológicas, mas também uma dolorosa destruição do espírito. E o mesmo vemos também no ocidente, onde cresce constantemente a distância entre pobres e ricos e se produz uma inquietante degradação da dignidade pessoal com a droga, o álcool e as sutis miragens de felicidade” (Bento XVI, Aparecida, Discurso inaugural). 

DIVORCIADOS RECASADOS

           As notícias e repercussões do último Sínodo Extraordinário perturbaram o mundo católico, especialmente o assunto da comunhão dos divorciados recasados. Muitos consideraram uma grande abertura da Igreja, principalmente do Papa Francisco, ao dizer que esses casais devem ser bem tratados e acolhidos, como se isso fosse grande novidade.
Na verdade, o Papa S. João Paulo II já escrevera, em 1981, em sua Exortação Apostólica Familiaris Consortio (n. 84): “A Igreja, com efeito, instituída para levar à salvação todos os homens e sobretudo os batizados, não pode abandonar aqueles que, unidos já pelo vínculo matrimonial sacramental, passaram a novas núpcias. Por isso, esforçar-se-á infatigavelmente por proporcionar-lhes os meios de salvação...  Exorto vivamente os pastores e a inteira comunidade dos fiéis a ajudar os divorciados, promovendo com caridade solícita que eles não se considerem separados da Igreja, podendo, ou melhor devendo, enquanto batizados, participar na sua vida. Sejam exortados a ouvir a Palavra de Deus, a frequentar o Sacrifício da Missa, a perseverar na oração, a incrementar as obras de caridade e as iniciativas da comunidade em favor da justiça, a educar os filhos na fé cristã, a cultivar o espírito e as obras de penitência para assim implorarem, dia a dia, a graça de Deus. Reze por eles a Igreja, encoraje-os, mostre-se mãe misericordiosa e sustente-os na fé e na esperança”.
S. João Paulo II, fiel à Tradição doutrinária da Igreja, acrescenta: “A Igreja, contudo, reafirma a sua práxis, fundada na Sagrada Escritura, de não admitir à comunhão eucarística os divorciados que contraíram nova união. Não podem ser admitidos, dado que seu estado e condições de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e atuada na Eucaristia. Há, além disso, outro peculiar motivo pastoral: se se admitissem estas pessoas à Eucaristia, os fiéis seriam induzidos em erro e confusão acerca da doutrina da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimônio”.
Sabe-se que houve várias propostas mais liberais a esse respeito. Mas, já em 1994, na “Carta aos Bispos da Igreja Católica a respeito da recepção da comunhão eucarística por fiéis divorciados novamente casados” (n. 6), o Cardeal Joseph Ratzinger, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, depois Bento XVI, explicava: “Face às novas propostas pastorais acima mencionadas, esta Congregação considera pois seu dever reafirmar a doutrina e a disciplina da Igreja nesta matéria. Por fidelidade à palavra de Jesus Cristo, a Igreja sustenta que não pode reconhecer como válida uma nova união, se o primeiro Matrimônio foi válido. Se os divorciados se casam civilmente, ficam numa situação objetivamente contrária à lei de Deus. Por isso, não podem aproximar-se da comunhão eucarística, enquanto persiste tal situação”. 
Mas, poder-se-ia perguntar, por que tanta severidade? O Catecismo da Igreja Católica nos responde que a Igreja não possui qualquer poder de dispensa quando se trata de disposições do direito divino (n. 1640).