A DEFESA E A VIOLÊNCIA

                                    

            Na vida de São Pio X, lê-se que, no início da primeira guerra mundial, o imperador da Áustria pediu-lhe a bênção para a suas tropas. O Papa ordenou que lhe respondessem: “Eu abençoo a paz, não a guerra”.

            Sobre o uso das armas disse Jesus: “Quem não tiver espada, venda o manto para comprar uma” (Lc 22, 36). E: “Todos os que usam da espada, pela espada perecerão” (Mt 26, 52).

            Sobre essa questão do uso das armas, recordo a posição da Igreja sobre a legítima defesa e o desarmamento. As duas posições, aparentemente contraditórias, podem se conciliar.

A legítima defesa é doutrina claramente exposta no Catecismo da Igreja Católica: “Quem defende a sua vida não é réu de homicídio, mesmo que se veja constrangido a desferir sobre o agressor um golpe mortal... A legítima defesa pode ser não somente um direito, mas até um grave dever para aquele que é responsável pela vida de outrem...” “os detentores legítimos da autoridade têm o direito de recorrer mesmo às armas para repelir os agressores da comunidade civil confiada à sua responsabilidade” (nn.2263-67). Portanto, há a possibilidade e até a necessidade de se estar armado: a polícia, o exército, um pai de família que mora na zona rural, as autoridades e seus guarda-costas, etc.

Outra coisa é a guerra cultivada e a corrida armamentista desenfreada. Contra essas é que a Igreja se opõe: o cultivo da guerra e a violência com o uso das armas. É nesse sentido que se deve entender o que disse Dom Orlando Brandes, nosso caro Arcebispo de Aparecida: “Para ser pátria amada não pode ser pátria armada!”

Ouçamos a voz dos Papas:

      “É necessário que com seriedade e lealdade se proceda a uma limitação progressiva e adequada dos armamentos (…) Segundo a medida que se realizar o desarmamento, será preciso estabelecer meios apropriados, honrosos para todos e eficazes” (Ven. Pio XII 24/12/1941).

      “A justiça, a reta razão e o sentido da dignidade humana terminantemente exigem que se pare com essa corrida ao poderio militar, que o material de guerra, instalado em várias nações, se vá reduzindo duma parte e doutra, simultaneamente, que sejam banidas as armas atômicas; e, finalmente, que se chegue a um acordo para a gradual diminuição dos armamentos, na base de garantias mútuas e eficazes”  (S. João XXIII, Pacem in Terris, 1963).

               “Se vós quereis ser irmãos, deixai cair as armas das vossas mãos. Não se pode amar com armas ofensivas nas mãos” (S. Paulo VI, ONU, 4/10/1965)

      “A manutenção da paz mundial exige enérgica tomada de posição em favor dos direitos humanos e esforços resolutos para um desarmamento geral” (S. João Paulo II, 28/10/1982).

               O desarmamento não diz respeito unicamente aos armamentos dos Estados,

mas compromete todos os homens, chamados a desarmar o próprio coração e a ser em toda a parte construtores de paz (…) não se pode descuidar o efeito que os armamentos provocam no estado de espírito e no comportamento do homem. Com efeito, as armas por sua vez tendem a alimentar a violência” (Bento XVI, 10/4/2008).

               “Rezemos para que no mundo prevaleçam os programas de desenvolvimento e não aqueles para os armamentos” (Francisco,28/9/2018).

 

        *Bispo da Administração Apostólica Pessoal

                                                                         São João Maria Vianney

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SÍNODO E MISSÃO

 

O dia mundial das Missões, que será acontecerá no próximo domingo, data criada em 1926 pelo Papa Pio XI, é celebrado anualmente em toda a Igreja, para recordar o caráter missionário que deve sempre estar presente na ação eclesial, incentivando a todos os cristãos a se comprometerem como missionários, emissários da evangelização. O Mês de outubro é o mês das Missões. Missão é o mandato que Jesus deu à sua Igreja: “Ide e fazei discípulos todos os povos...” (Mt 28, 19).

Domingo passado, tivemos a abertura da fase do Sínodo dos Bispos em todas as dioceses, como preparação para a grande assembleia do Sínodo dos Bispos no Vaticano, em outubro de 2023, com o tema “Por uma Igreja Sinodal: Comunhão, Participação e Missão”.

Em sua mensagem para o dia das Missões deste ano, o Papa Francisco usou como lema a frase dos Apóstolos: “Não podemos deixar de afirmar o que vimos e ouvimos” (At 4, 20).

“Quando experimentamos a força do amor de Deus, quando reconhecemos a sua presença de Pai na nossa vida pessoal e comunitária, não podemos deixar de anunciar e partilhar o que vimos e ouvimos. A relação de Jesus com os seus discípulos, a sua humanidade que nos é revelada no mistério da Encarnação, no seu Evangelho e na sua Páscoa mostram-nos até que ponto Deus ama a nossa humanidade e assume as nossas alegrias e sofrimentos, os nossos anseios e angústias (cf. Conc. Ecum. Vat II, Const. past. Gaudium et spes, 22). Tudo, em Cristo, nos lembra que o mundo em que vivemos e a sua necessidade de redenção não Lhe são estranhos e também nos chama a sentirmo-nos parte ativa desta missão: ‘Ide às saídas dos caminhos e convidai todos quantos encontrardes’ (cf. Mt 22, 9). Ninguém é estranho, ninguém pode sentir-se estranho ou afastado deste amor de compaixão”.

A história da evangelização tem início com uma busca apaixonada do Senhor, que chama e quer estabelecer com cada pessoa, onde quer que esteja, um diálogo de amizade (cf. Jo 15, 12-17). Os Apóstolos são os primeiros que nos referem isso, lembrando inclusive a hora do dia em que O encontraram: ‘Eram as quatro da tarde’ (Jo 1, 39). A amizade com o Senhor, vê-Lo curar os doentes, comer com os pecadores, alimentar os famintos, aproximar-Se dos excluídos, tocar os impuros, identificar-Se com os necessitados, fazer apelo às bem-aventuranças, ensinar de maneira nova e cheia de autoridade, deixa uma marca indelével, capaz de suscitar admiração e uma alegria expansiva e gratuita que não se pode conter. Como dizia o profeta Jeremias, esta experiência é o fogo ardente da sua presença ativa no nosso coração que nos impele à missão, mesmo que às vezes implique sacrifícios e incompreensões (cf. 20, 7-9). O amor está sempre em movimento e põe-nos em movimento, para partilhar o anúncio mais belo e promissor: ‘Encontramos o Messias’ (Jo 1, 41)”.

“Como os apóstolos e os primeiros cristãos, também nós exclamamos com todas as nossas forças: ‘não podemos deixar de afirmar o que vimos e ouvimos’ (At 4, 20)”.

 

        *Bispo da Administração Apostólica Pessoal

                                                                         São João Maria Vianney

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AOS PROFESSORES, NOSSOS MESTRES

                                 

         

Dia 15 de outubro próximo, dia de Santa Teresa de Jesus, grande mestra da vida espiritual, e exatamente por isso, é comemorado o dia do professor. Aos mestres, todo o nosso carinho. Deles dependem todos os outros profissionais.

Deixo aqui consignada a minha saudação e gratidão a todos os que se dedicam a essa nobre e benemérita carreira, difícil, mas nem sempre reconhecida e condignamente gratificada. Mais do que uma profissão, educar é uma arte, uma vocação e uma missão: formar, conduzir crianças, jovens e adultos no caminho da verdade, sugerindo opiniões conscientes, aconselhando e tornando-se amigos e irmãos dos seus alunos. Que Deus os abençoe e lhes dê coragem, paciência e perseverança nessa sua verdadeira missão. Missionários da educação!

A melhor definição de educação nós a encontramos no Direito Canônico, conjunto de normas da Igreja (cânon 795): é a formação integral da pessoa humana, dirigida ao seu fim último e, ao mesmo tempo, ao bem comum da sociedade, de modo que as crianças e jovens possam desenvolver harmonicamente seus dotes físicos, morais e intelectuais, adquirir um sentido mais perfeito da responsabilidade e um uso correto da liberdade, preparando-se para participar ativamente da vida social. Que missão nobre, sublime e difícil a do professor-educador! Indicando aos alunos o sentido da vida, ele vai ajudá-los a dominar seus instintos e a dirigi-los pela razão, a desenvolver o conjunto de suas faculdades, a combater as más paixões e desenvolver as boas, a adquirir o domínio de si e a orientar seus sentimentos, levando em conta as diversas fases da vida e as características do seu temperamento, formando assim sua personalidade e seu caráter. Sendo assim, o mestre é cooperador da Graça de Deus, que, como Pai, só quer o bem dos seus filhos. 

Recordo algumas célebres citações que envolvem educação: “Ser-se-á tudo ou nada, conforme a educação recebida” (Clemente XIV). “Educação, o teu nome é paciência” (Marcel Prévost). “Pegam-se mais moscas com uma gota de mel do que com um barril de vinagre” (São Francisco de Sales). “Não há um só de nós que não tenha em si a raiz dum santo ou dum celerado” (Lacordaire). “Educação para a vida, valores para sempre” (Lema do Colégio Três Pastorinhos). “Ser mestre não é só contar a história/ de um certo Pedro Álvares Cabral/ Mas descobrir, de novo, a cada dia, / um mundo grande, livre, fraternal. - Ser mestre não é só mostrar nos mapas/ onde se encontra o Pico da Neblina/ Mas é subir, guiando os alunos,/ à montanha da vida que se empina... Ser mestre é ser o pai, a mãe, o amigo,/ mostrando sempre a direção da luz,/ pois a palavra Mestre – sobretudo –/ também é um dos nomes de Jesus” (Antônio Roberto Fernandes).

            A você, portanto, caro professor e querida professora, a nossa homenagem por ter recebido de Deus tão nobre e importante missão e a nossa gratidão reconhecida pelo seu trabalho, que não se mede pela produção imediata, mas por frutos, muitas vezes escondidos, que só vão aparecer ao longo da vida e que estarão escritos no livro da eternidade. “Os que educaram a muitos para a justiça brilharão como estrelas para sempre” (Dn 12,3).

 

        *Bispo da Administração Apostólica Pessoal

                                                                         São João Maria Vianney

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O PAPA NA IGREJA

 

Um dos alicerces da nossa catolicidade, da Igreja Católica, é a instituição do Papado: o Papa como sucessor de São Pedro, constituído como chefe da Igreja, aquele que tem as chaves, o poder de ligar e desligar, sancionado por Deus no Céu. Nele se cumpre a promessa que Jesus fez à sua Igreja: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28, 20).

            Repito isso porque, alguns cristãos, zelosos pela ortodoxia, no ímpeto de defender algum dos valores e riquezas da Igreja, esquecem-se desse valor primordial. Destruído esse, os outros valores se desmoronam. Perde-se o vínculo da unidade na Igreja e da união com o fundador.        

           Uma das provas de que a Igreja é indefectível, apesar das fraquezas humanas, e goza da assistência contínua e infalível do seu fundador, é a instituição do Papado, que nos dá a garantia da presença contínua dele na sua Igreja, através daquele que lhe faz as vezes, o seu Vigário. 

           Jesus escolheu como seu vigário (que lhe faz as vezes, repito) na terra, Pedro, a pedra. E Pedro, primeiro Papa, é uma figura emblemática e paradigmática. Pedro se chamava Simão. Jesus lhe mudou o nome, significando sua missão, como é habitual nas Escrituras: “Tu és Simão, filho de João. Tu te chamarás Cefas! (que quer dizer Pedro - pedra)” (Jo 1, 42). Quando Simão fez a profissão de Fé na divindade de Jesus, este lhe disse: “Não foi carne e sangue quem te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu. Por isso, eu te digo: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as forças do inferno não poderão vencê-la. Eu te darei as chaves do Reino dos Céus (a Igreja): tudo o que ligares na terra será ligado nos céus e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus” (Mt 16, 13-19). Corajoso e com imenso amor pelo Senhor, sentiu também sua fraqueza humana, ao negar três vezes que o conhecia. “Simão, Simão! Satanás pediu permissão para vos peneirar, como o trigo. Eu, porém, orei por ti, para que tua fé não desfaleça. E tu, uma vez convertido, confirma os teus irmãos” (Lc 22, 31-32).  E Pedro, depois de ter chorado seu pecado, foi feito por Jesus o Pastor da sua Igreja.

São Pedro, fraco por ele mesmo, mas forte pela força que lhe deu Jesus, representa bem a Igreja de Cristo. “Cremos na Igreja una, santa, católica e apostólica, edificada por Jesus Cristo sobre a pedra que é Pedro... Cremos que a Igreja, fundada por Cristo e pela qual Ele orou, é indefectivelmente una, na fé, no culto e no vínculo da comunhão hierárquica. Ela é santa, apesar de incluir pecadores no seu seio; pois em si mesma não goza de outra vida senão a vida da graça. Se realmente seus membros se alimentam dessa vida, se santificam; se dela se afastam, contraem pecados e impurezas espirituais, que impedem o brilho e a difusão de sua santidade. É por isso que ela sofre e faz penitência por esses pecados, tendo o poder de livrar deles a seus filhos, pelo Sangue de Cristo e pelo dom do Espírito Santo” (Credo do Povo de Deus).

Nenhuma sociedade humana sobreviveria a tantas fraquezas e dificuldades, se não fosse a ação do Espírito Santo que a mantém incólume no meio de todas essas tempestades, até a consumação dos séculos.

 

        *Bispo da Administração Apostólica Pessoal

                                                                         São João Maria Vianney

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