Crise significa situação de conflito e tensão. Em medicina, a evolução de uma doença. Crise pode ser para o bem ou para o mal. Situação conflitiva.
Quando me dizem que o mundo está hoje em crise, eu pergunto: “Quando é que não esteve?” O mesmo vale para a Igreja.
Estou lendo um livro interessante, intitulado “As crises da Igreja”, de dois autores franceses, Silvie Bernay, leiga consagrada, doutora em história, e Bernard Peyrous, padre, doutor em letras, especialista em história da espiritualidade (Editora Santuário, 2023).
O primeiro capítulo trata da crise nas origens do cristianismo, o problema do batismo dos primeiros pagãos. São Lucas, evangelista, nos Atos dos Apóstolos, escrito no primeiro século, relata um fato, certamente acontecido antes do ano 50, que provocou uma verdadeira crise no seio da primeira comunidade cristã: o batismo dos primeiros pagãos, o centurião Cornélio e sua família, pelo apóstolo Pedro. Com a mentalidade judaica de ser o povo escolhido, único, contrastava a mensagem de Jesus, o bom Pastor: “Tenho ainda outras ovelhas, que não são deste redil; também a essas devo conduzir, e elas escutarão a minha voz, e haverá um só rebanho e um só pastor” (Jo 10, 16). Essa doutrina começou a ser posta em prática, com o batismo de Cornélio, não sem gerar incômodo e discussão entre os Apóstolos e entre os primeiros cristãos, crise superada no Concílio de Jerusalém, com a autoridade apostólica.
Nos séculos I-IV, houve as crises de compreensão da pessoa divino-humana de Cristo, surgindo várias heresias, a gnose, o arianismo, o nestorianismo, etc, condenadas pela autoridade da Igreja, nos Concílios ecumênicos.
Na Idade Média, duas grandes crises aconteceram, com os papas indignos do século X e com a querela das investiduras, nos séculos XI e XII. No século XI (ano 1054), houve ainda a ruptura entre a Igreja de Roma e a Igreja de Constantinopla, surgindo as Igrejas ortodoxas, ferida que ainda persiste no seio do cristianismo. Houve também nesse tempo a crise cátara.
No século XVI ocorreu a grande explosão da cristandade, com a revolta de Martinho Lutero, lançando as bases da Reforma Protestante, com o princípio do livre exame, que deu origem a uma multidão de seitas, divisões e subdivisões, até hoje.
A crise das luzes, o Iluminismo, provocou uma ruptura com as mães pátrias: Jerusalém, Atenas e Roma, numa virada que passou do mundo objetivo para o mundo subjetivo. Aparece então a catástrofe da Revolução Francesa.
Chegamos assim às turbulências do século XX e XXI, com as guerras mundiais, o comunismo e o Concílio Vaticano II, que deu azo à crise atual na Igreja, por parte daqueles que dele se aproveitaram, para, falsamente interpretado, colocarem em prática ideias heterodoxas, que a Igreja, com dificuldade, procura corrigir. As crises devem suscitar a nossa oração, com a confiança em Deus e na sua Igreja: “Non praevalebunt! (Não prevalecerão) (Mt 16,18).