O MÊS DA BÍBLIA

      No próximo dia 28, último domingo de setembro, celebraremos o dia nacional da Bíblia, que coincide com a festa de São Jerônimo, o grande tradutor dos Livros Santos. Aliás, o mês de setembro é o mês da Bíblia, todo dedicado a despertar e promover entre os fiéis o conhecimento e o amor dos Livros Sagrados, a Palavra de Deus escrita, redigida sob a moção do Divino Espírito Santo, motivando-os para sua leitura cotidiana, atenta e piedosa. 
     É de São Jerônimo a célebre frase: “Ignorar a Sagrada Escritura é ignorar o próprio Cristo”.  Portanto, o conhecimento e o amor às Escrituras decorrem do conhecimento e do amor que todos devemos a Nosso Senhor.  
      O ponto central da Bíblia, convergência de todas as profecias, é Jesus Cristo. O Antigo Testamento é preparação para a sua vinda e o Novo, a realização do seu Reino. “O Novo estava latente no Antigo e o Antigo se esclarece no Novo” (Santo Agostinho). 
      Dizemos que a Bíblia foi inspirada por Deus, que vem a ser assim o seu autor principal, embora escrita por homens, por Deus movidos e assistidos enquanto escreviam. 
      A Bíblia não é um livro só, mas um conjunto de 73 livros, redigidos por autores diferentes em épocas, línguas e locais diversos, num espaço de tempo de cerca de mil e quinhentos anos. Sua unidade se deve ao fato de terem sido todos eles inspirados por Deus, seu autor principal e garantia da sua inerrância. 
      É o livro sagrado por excelência, escrito para o nosso bem. “Toda a Escritura é inspirada por Deus, e útil para ensinar, para repreender, para corrigir e para formar na justiça. Por ela, o homem de Deus se torna perfeito, capacitado para toda boa obra” (II Tim 3, 16-17). 
     Mas a Bíblia não é um livro de ciências humanas. Por isso a Igreja Católica reprova a leitura fundamentalista da Bíblia, que teve sua origem na época da Reforma Protestante e que pretende dar a ela uma interpretação literal em todos os seus detalhes, o que não é correto. 
     Além disso, a Bíblia não é um livro fácil de ser lido e interpretado. São Pedro, falando das Epístolas de São Paulo, nos diz que “nelas há algumas passagens difíceis de entender, cujo sentido os espíritos ignorantes ou pouco fortalecidos deturpam, para a sua própria ruína, como o fazem também com as demais Escrituras” (II Ped 3, 16).
     Por isso, o mesmo São Pedro nos adverte: “Sabei que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação pessoal. Porque jamais uma profecia foi proferida por efeito de uma vontade humana. Homens inspirados pelo Espírito Santo falaram da parte de Deus” (2Pd 1, 20-21).  Assim, o ofício de interpretar autenticamente a palavra de Deus escrita (a Bíblia Sagrada) ou transmitida oralmente (a Sagrada Tradição) foi confiado unicamente ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de Jesus Cristo, que disse aos Apóstolos e seus sucessores “até a consumação dos séculos”: “Ide e ensinai a todos os povos tudo o que vos ensinei... quem vos ouve a mim ouve”.

COERÊNCIA NA POLÍTICA

            A coerência é uma virtude cristã que deve penetrar todas as nossas ações e atitudes. Pensar, viver e agir conforme a nossa fé e nossas convicções cristãs. Caso contrário, seremos hipócritas e daremos um grande contra-testemunho do nosso cristianismo. A consciência é única e unitária, e não dúplice. Não se age como católico na Igreja e como pagão fora dela.
“O Concílio exorta os cristãos, cidadãos de ambas as cidades [terrena e celeste], a que procurem cumprir fielmente os seus deveres terrenos, guiados pelo espírito do Evangelho. Afastam-se da verdade os que, sabendo que não temos aqui na terra uma cidade permanente, mas que vamos em demanda da futura, pensam que podem por isso descuidar os seus deveres terrenos, sem atenderem a que a própria fé ainda os obriga mais a cumpri-los, segundo a vocação própria de cada um. Mas não menos erram os que, pelo contrário, opinam poder entregar-se às ocupações terrenas, como se estas fossem inteiramente alheias à vida religiosa, a qual pensam consistir apenas no cumprimento dos atos de culto e de certos deveres morais. Este divórcio entre a fé que professam e o comportamento quotidiano de muitos deve ser contado entre os mais graves erros do nosso tempo” (Gaudium et Spes, 43).
O ensinamento social da Igreja não é uma intromissão no governo de cada País. Não há dúvida, porém, que põe um dever moral de coerência aos fiéis leigos, no interior da sua consciência, que é única e unitária. “Não pode haver, na sua vida, dois caminhos paralelos: de um lado, a chamada vida ‘espiritual’, com os seus valores e exigências, e, do outro, a chamada vida ‘secular’, ou seja, a vida de família, de trabalho, das relações sociais, do empenho político e da cultura” (João Paulo II, Christif. Laici). 
 “Reconhecendo muito embora a autonomia da realidade política, deverão se esforçar os cristãos solicitados a entrarem na ação política por encontrar uma coerência entre as suas opções e o Evangelho” (Paulo VI, Octogésima Adveniens, 46).
 “Também para o cristão é válido que, se ele quiser viver a sua fé numa ação política, concebida como um serviço, não pode, sem se contradizer a si mesmo, aderir a sistemas ideológicos ou políticos que se oponham radicalmente, ou então nos pontos essenciais, à sua mesma fé e à sua concepção do homem...” (cf. Paulo VI, Octogésima Adveniens, 26).
A Igreja proclamou São Tomás Moro padroeiro dos Governantes e dos Políticos, exatamente porque soube ser coerente com sua posição católica até ao martírio.
       Nesse clima de corrupção e venalidade que invadiu o nosso sistema político, eleitoral e governamental, possa o exemplo de Santo Tomás More ensinar aos nossos governantes e políticos, atuais e futuros, que o homem não pode se separar de Deus, nem a política da moral, e que a consciência não se vende por nenhum preço, mesmo que isto nos custe caro e até a própria vida. Isso se aplica aos políticos, aos candidatos e a nós eleitores: voto não se vende nem se compra: mas tem grandes consequências. Use o critério moral e cristão na hora de votar.

EM QUEM VOTAR

         Aproximam-se as eleições. Devemos encará-las com seriedade para votar certo e bem, pois do nosso voto também depende o futuro do nosso país e a definição da vida política de nossa pátria. Por isso, nós, Bispos do Estado do Rio de Janeiro, fizemos uma pequena cartilha de recomendações para essas eleições, que tem sido distribuída nas igrejas.
       A Igreja não tem partidos nem candidatos. Não impõe nomes a serem sufragados nem obriga a votar em determinados candidatos. Somos contra o clientelismo e o chamado “voto de cabresto”. Assim como a Fé, o voto deve ser racional. A Igreja deixa à livre e responsável decisão dos eleitores católicos a escolha em quem votar. Ajuda-nos, porém, nessa reflexão. Diz, sobretudo, em quem não votar. Há candidatos e partidos que não podem receber o nosso apoio.
      Procure conhecer os candidatos: conduta, ideias e partidos. Observe se seus candidatos estão comprometidos com a justiça, segurança, combate à violência, dignidade da pessoa, respeito pela vida humana desde a concepção até a morte natural. Não vote em candidatos ou partidos, que sejam favoráveis ao aborto e à eutanásia. Vote apenas em candidatos que promovam e defendam a família, segundo sua identidade natural conforme o plano de Deus.
      Jamais se deve votar em candidatos comprovadamente corruptos. “É muito difícil que um corrupto consiga voltar atrás”, falou o Papa Francisco aos Parlamentares italianos. Dê o seu voto apenas a candidatos com “ficha limpa”, pois o homem público deve ter honestidade. Diga não à corrupção. Mas não só dos políticos e candidatos como à tentação de corrupção, que cada um de nós sente: não favoreça a corrupção eleitoral, à compra de votos, votando por interesse material e não com consciência. Voto não é troca de favores.
        Ademais, observe se o candidato trabalha para o bem comum ou para o seu próprio interesse. Veja se ele representa apenas o seu grupo ou partido ou se pretende promover políticas que beneficiam a todos: o bom governante e legislador governa e faz leis para todos.
       Vote em candidatos comprometidos seriamente com a superação da pobreza, com a educação, saúde, moradia, saneamento básico, respeito à vida e ao meio ambiente. “Rezo ao Senhor para que nos conceda mais políticos que levem verdadeiramente a sério a sociedade, o povo, a vida dos pobres” (Papa Francisco, Evangelii Gaudium, 205).
       Vote em candidatos que respeitem a liberdade religiosa e de consciência, não sejam fanáticos nem fundamentalistas religiosos, e que garantam o ensino religioso confessional e plural nas escolas públicas.
       Pelo seu passado e pelo seu discurso se pode conhecer o candidato. E acompanhe os políticos depois das eleições, para cobrar deles o cumprimento das promessas de campanha e apoiar suas ações políticas e administrativas. 
      Essa participação na política é o importante e correto exercício da cidadania. Lembre-se que voto não tem preço, não se compra nem se vende. E tem várias e sérias consequências. 

A PÁTRIA AMADA

         Estamos na Semana da Pátria, da nossa Pátria amada. Jesus, nosso divino modelo, amava tanto sua pátria, que chorou sobre sua capital, Jerusalém, ao prever os castigos que sobre ela viriam, consequência da sua resistência à graça divina. É tempo oportuno para refletirmos sobre nossa nação, na qual vivemos e da qual esperamos o nosso bem comum. Será que também não devemos chorar sobre nossa pátria, ao vermos tanta falta de ética em nossa política, ao sentirmos e pressentirmos a aprovação de leis iníquas, contra a Lei Divina, natural e positiva?
Segundo Aristóteles, “o homem é por natureza um animal político, destinado a viver em sociedade” (Política, I, 1,9). Política vem do grego pólis, que significa cidade. E, continua Aristóteles, “toda a cidade é evidentemente uma associação, e toda a associação só se forma para algum bem, dado que os homens, sejam eles quais forem, tudo fazem para o fim do que lhes parece ser bom”. E Santo Tomás de Aquino cunhou o termo bem comum, ou bem público, que é o bem de toda a sociedade, dando-o como finalidade do Estado. “A comunidade política existe... em vista do bem comum; nele encontra a sua completa justificação e significado e dele deriva o seu direito natural e próprio. Quanto ao bem comum, ele compreende o conjunto das condições de vida social que permitem aos indivíduos, famílias e associações alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição” (Gaudium et Spes, 74). Daí se conclui que a cidade – o Estado - exige um governo que a dirija para o bem comum. Não se pode separar a política da direção para o bem comum. Procurar o bem próprio na política é um contrassenso.
          Parecia estar falando da política atual o notável Eça de Queirós, que, há muito tempo atrás, escrevera com sua verve inconfundível: “Estamos perdidos há muito tempo... O país perdeu a inteligência e a consciência moral. Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada. Os caracteres corrompidos. A prática da vida tem por única direção a conveniência. Não há princípio que não seja desmentido. Não há instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita... Ninguém crê na honestidade dos homens públicos... A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia. O povo está na miséria. Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente. O Estado é considerado na sua ação fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo. A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências. Diz-se por toda a parte, o país está perdido! Algum opositor do atual governo? Não!”. Falava ele assim em 1871!
         Como cristãos, nós sabemos que a base da moral e da ética é a lei de Deus, natural e positiva, traduzida na conduta pelo que se chama o santo temor de Deus ou a consciência reta e timorata. Uma vez perdido o santo temor de Deus, perde-se a retidão da consciência, que passa a ser regida pelas paixões. Uma vez perdidos os valores morais e os limites éticos, a política fica ao sabor das paixões desordenadas do egoísmo, da ambição e da cobiça.

         Pense nisso: seu voto é coisa séria, pois terá sérias consequências para a política!